Vida e Missão neste chão

Uma vida em Açailândia (MA), agora itinerante por todo o Brasil...
Tentando assumir os desafios e os sonhos das pessoas e da natureza que geme nas dores de um parto. Esse blog para partilhar a caminhada e levantar perguntas: o que significa missão hoje? Onde mora Deus?
Vamos dialogar sobre isso. Forte abraço!
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@dariocombo; Foto: Marcelo Cruz

lunedì 12 settembre 2011

Jesus caminha no meio de nós

Nos dias 10 e 11 de setembro, vivemos no Piquiá/Açailândia uma autêntica experiência de fé e encontro com Cristo ressuscitado.

“Eis que eu estou convosco todos os dias, até o fim do mundo”, disse o Senhor que venceu a morte. Referia-se, acreditamos, ao fim desse mundo de injustiças e à nova criação de um Reino de partilha e harmonia entre todas as criaturas.

A Romaria da Terra e das Águas foi mais um pedacinho de construção desse novo mundo, em que a Igreja acredita e que nasce e cresce sempre a partir dos pequenos e excluídos.

Foi muito bonito escutar a voz deles, vindo de todos os cantos do Maranhão; dançar ao ritmo de festa do xote das quebradeiras de coco, das músicas indígenas e quilombolas, dos repentes criados pelas pequenas comunidades rurais. Gritos de denúncia e sonhos de vida foram celebrados com intensidade pelos dez mil romeiros presentes no Piquiá. A celebração eucarística foi profunda, participada, cheia de vida. A marcha até o Piquiá de Baixo entrelaçou a denúncia profética de um sistema que gera impactos e poluição e a esperança de um povo que apesar de tudo nunca deixa de caminhar, com a cabeça erguida: “Estou vendo tudo, não fico calado pois eu não estou mudo!” – cantavam os romeiros e romeiras.

A todos eles e elas vai nosso profundo agradecimento: juntos sentimos que Jesus de Nazaré caminha e vive também pelas estradas do Maranhão, ao lado de um povo que sabe o que quer e tem direito de ser escutado e respeitado.

Nossa fé fortaleceu-se e a união das comunidades e dioceses do Maranhão estreitou-se ainda mais. Essa Romaria, como sempre dissemos, não se limita a um evento, mas se insere num processo que vem de longe e nos convida, agora, a não trair os sonhos e as expectativas que acendemos no coração de tantas comunidades, povos, pessoas.

Regressemos, irmãos e irmãs, a nossas casas e comunidades. Essa chama que nos animou não se apague, ilumine nossas lutas e resistências do dia-a-dia e volte a brilhar mais e mais vezes em eventos bonitos e intensos como aquele que acabamos de celebrar.

Com muita gratidão nos despedimos de cada romeiro e romeira. Que a saudade de novos encontros nos mantenha vivos e amigos nessa caminhada com o Senhor ressuscitado!

Via Sacra em Êxodo

Cinco passos rumo à ressurreição de Piquiá de Baixo e dos atingidos pelos grandes projetos

1. Introdução

A Romaria da Terra e das Águas do Maranhão impulsionará milhares de pessoas a caminho rumo ao Piquiá de Baixo. Lá encontraremos um povo que já caminha em Êxodo há mais de cinco anos.
O povo de Piquiá de Baixo pretende sair de uma terra de poluição e desemprego, para uma terra de moradia digna, saúde e dignidade.
Há cinco anos essa caminhada se fez pública e corajosa, envolvendo o Ministério Público, a Defensoria, a mídia nacional e internacional. Os poderosos foram desafiados por trezentos famílias de um pequeno povoado, e tiveram que se dobrar, pelo menos para escutar o grito desses sofredores.
A igreja de todos os cantos do Maranhão, também, quer ser romeira nesse Êxodo rumo a um novo Piquiá, um novo Maranhão, um outro jeito de viver bem, em equilíbrio e harmonia entre nós e com a criação toda!

Esse êxodo de libertação que a Romaria percorre é também uma Via Sacra: caminhamos, passo a passo, ao ritmo de todos os povos e comunidades atingidas pelos grandes projetos, por um desenvolvimento que não é para todos. Comunidades tradicionais ameaçadas e crucificadas, espoliadas de suas terras e frutos, que são suas vestes e sustento. Camponeses expulsados de suas terras, forçados a morrer fora das portas da cidade, não mais cidadãos de nosso País de ordem e progresso.
Vamos caminhando, irmãos e irmãs, nessa Via Sacra das vítimas sócio-ambientais, porque ainda há uma ressurreição, uma terra prometida, ainda tem como destruir os sistemas que destroem a terra!

  1. Primeira estação: a sedução

E fácil convencer o povo que não há alternativas!

Na época de Jesus, o império romano convenceu muitos poderosos e influentes em Israel que aquele era o melhor dos mundos possíveis. Claro, talvez era um pouco violento e injusto, mas tudo isso era necessário para manter a ordem e crescer e prosperar.
Não deve ter sido fácil para Jesus desmontar essa verdade sedutora do império.

Também Moisés sofreu em convencer o povo escravo no Egito que podia existir uma vida melhor, mais livre, mais gostosa do que as cebolas de Egito!

Hoje também nós queremos caminhar e acreditar que existe um mundo melhor do que esse. Que a poluição não é indispensável. Que é possível viver e produzir respeitando a natureza. Que não se pode lucrar à custa dos pulmões ou da fome do povo!

Pai Nosso, não nos deixei cair na tentação dos poderosos e de sua lógica. Hoje, amanhã e sempre deverá haver pão para cada dia!

3. Segunda estação: o desânimo e as quedas

Jesus caiu três vezes. Moisés quebrou as tábuas da lei pela raiva contra um povo teimoso e infiel. Israel quis voltar atrás e amaldiçoou a Deus.

Também as comunidades que buscam liberdade e lutam por um mundo mais justo e bonito muitas vezes desanimam. Algumas pessoas recuam e influenciam os outros para render-se à realidade invencível.
As próprias empresas aproveitam para dividir as comunidades, conquistar o favor de algumas lideranças e enfraquecer a luta coletiva.
Mas apesar das quedas Jesus levantou-se, o povo voltou a caminhar. Moisés viu a terra prometida de longe e seu povo entrou, livre, numa região onde corre leite com mel.

Não temos medo das quedas e do desânimo. Queremos voltar a caminhar, oferecer nosso braço a todos e todas que estiverem caídos ou à beira do caminho. Vamos, irmãos, vamos irmãs: ninguém pode nos parar!

  1. Terceira estação: a perseguição

Jesus foi condenado à morte de cruz, como um revolucionário, como um terrorista. O povo de Israel em fuga foi perseguido pelas milícias do Egito, com cavalos e cavaleiros até o Mar Vermelho. Quem busca a liberdade e critica a ordem constituída é considerado subversivo e condenado, sem chances de se defender.

Assim também hoje, no Maranhão, quem defende os povos quilombolas é ameaçado de morte. Quem critica empresas fortes como a Vale é caluniado e processado. Quem fala em favor das vítimas do progresso é chamado de primitivo. Quem denuncia o trabalho escravo deve fugir e esconder-se para não ser perseguido.

Mas nós caminhamos de cabeça erguida, somos igreja de Deus, que está do lado dos pobres e dos oprimidos. Não temos medo e não deixaremos nos calar!

  1. Quarta estação: a ressurreição na terra prometida

Quando a Romaria chegará ao Piquiá de Baixo, terra-símbolo de muitas outras lutas e reivindicações, será só o começo de uma caminhada bem mais longa, dura e desafiadora: a Romaria dos Pequenos que a cada dia dão um passo rumo à libertação.

O caminho no deserto foi árduo, cheio de contradições, erros, recuos e desvios. Mas o povo chegou à terra prometida.
O caminho da cruz foi duro, pontuado por traições, abandonos, solidão e dúvidas, desânimo e teimosia. Mas o Pai não deixou a história terminar com a morte de Jesus.

Uma cruz branca acompanhará o povo a caminho e será erguida no Piquiá de Baixo. É uma cruz vazia, sem o corpo de Cristo, pois ele vive no meio de nós. Ressuscitou no povo a caminho de libertação!
A igreja do Maranhão, mais uma vez, compromete-se a tirar todos os pobres de suas cruzes, a caminhar ao lado deles por um Estado mais justo.
Sem medo do deserto ou da perseguição da cruz, todos nós assumimos o compromisso de sermos, pela vida inteira, romeiros em busca dos direitos da terra, da água e da gente!